domingo, 24 de julho de 2011

20 dias sem pedalar!

Pois é, pra quem tá viajando de bicicleta, ando muito sedentário!

Quando publiquei o último post estava em Uyuni e tinha acabado de receber a notícia de que meus pais viriam para a Bolívia me encontrar e conhecer um pouquinho do país. Teria que esperá-los quase uma semana e, como em Uyuni não tem nada pra fazer além do Salar, botei a bike num ônibus e fui para Sucre, que é a antiga capital da Bolívia. Até hoje é a capital constitucional (ainda não entendi muito bem como funciona essa coisa de ter duas capitais...) e prometia ser interessante.

Prometia e era! A cidade é linda, toda colonial, com casas branquinhas e muitos cafés. Mas a viagem até lá foi desesperadora: 8 horas de ônibus sem banheiro e sem paradas, sentindo os efeitos de um pratinho de chicharrón de llama que tinha comido antes de embarcar. Quando cheguei a sucre, às 5hs da manhã, o banheiro da rodoviária estava trancado, então ainda tive que pedalar até o albergue em situação de emergência. Quando cheguei, só fiz duas perguntas: tem vaga? Onde é o banheiro? E não apareci mais por algumas horas...

Depois da desintoxicação, fiz o check in e fui conhecer a cidade, começando pelo mercado, é claro. Um mercadão enorme, com barracas vendendo todo tipo de frutas, legumes, carne, queijo... comprei umas frutas diferentes pra conhecer, além de quatro tipos de batatas diferentes e mais uns legumes pra fazer uma sopinha, já que naquele estado não ousava comer na rua...





Os dias em Sucre foram ótimos. O albergue tinha um pessoal super legal, reencontrei Paolo e Pinar, um casal que também está viajando de bicicleta e que havia conhecido em Salta, também reencontrei Alex, o australiano que havia comprado a moto da Coni, a alemã que conheci a caminho de Tupiza e um francês, também de bicicleta, que tinha conhecido em Uyuni. Um grande reencontro e muita festa.














Manifestacao popular em Sucre



Para quem quiser conhecer um pouquinho da realidade da Bolívia, especificamente das minas do Cerro Rico de Potosi, recomendo ver um documentário que assisti em Sucre sobre um garoto de 14 anos que trabalha nessas minas. Dessa montanha foi extraída grande parte da prata levada para a Europa pelos espanhóis. Para se ter uma idéia do estrago, só nessa montanha morreram 8 milhões de pessoas, por conta de explosões de dinamite, soterramentos ou a causa de morte de quase todos que trabalham nas minas, o pulmão de pedra, ou silicose. Em geral os mineiros não passam dos 40 anos, porque a poeira das minas transforma seus pulmões em rocha...
O nome do documentário em inglês é ‘The Devil´s Miner’. Procurem.

Cerro Rico de Potosi: la montaña que come hombres


Depois da estadia em Sucre, peguei o ônibus de volta pra Uyuni, pra dar uma voltinha pelo Salar e esperar meus pais e minha irmã, que tinha conseguido ser liberada do trabalho e agora também estava vindo. Minha ida ao salar foi ótima! Cheguei de tardinha e fui até o hotel de sal, que era o primeiro ponto de referência no salar. Aliás, esse é um tema importantíssimo quando se está viajando pelo salar, porque não há estradas e a imensidão branca te faz perder a noção de direção e distância, então para se localizar tem que conhecer as montanhas da região e usá-las como referências. Para não ficar perdido lá no meio, assim que entrei no sal perguntei ao motorista de um jipe de turismo como eles se localizavam.



Enfim, chegando ao hotel de sal vi que era melhor acampar ali do que no meio do nada como eu pretendia, já que de noite venta bastante no salar e como o sal é duro, não dá para fincar os espeques (ferrinhos) da barraca, o que complica bastante... Assisti um pôr-do-sol lindo, deixei minha marca na bandeira do Brasil fincada ao lado do hotel de sal e montei minha barraquinha abrigado pelo hotel e amarrada às pernas de uma mesa a algumas pedras de sal que recolhi no lugar.















No dia seguinte passei a manhã ao lado do tal hotel de sal esperando para ver se minha família chegava, já que havia a possibilidade de chegarem naquele dia a Uyuni e, nesse caso, me encontrariam no salar. Junto comigo estava uma japonesa que tinha dormido no hotel e estava esperando um jipe de uma companhia de turismo vir buscá-la, e simplesmente não entendia como eles podiam estar mais de cinco minutos atrasados. Expliquei pra ela como funcionam os horários do lado de cá do mundo e quando o jipe chegou, com quase 3hs de atraso ela já estava até dormindo debruçada na mesa. Enquanto esperava conversei com gente do mundo todo, que ficavam impressionados de eu estar de bicicleta ali no meio do sal e dei até uma entrevista para uma revista argentina. Como o pessoal não chegou, fui dar uma pedalada pelo salar e depois voltei para Uyuni.




À noite, o momento tão esperado! Eles chegaram em um trem de Oruro, depois de 2 dias inteiros de viagem em três aviões, um ônibus e um trem! É muito amor!




Depois de 5 meses sem vê-los, foi maravilhoso esse encontro, e não faltava assunto pra conversar. Era papo o tempo inteiro... e com a vinda deles percebi que já tinha me acostumado até mais do que pensava com o frio, porque eles estavam sofrendo com o gelo de Uyuni.



No dia seguinte fomos em um passeio de jeep ao Salar, passando o dia toda nesse lugar impressionante. Fomos até a ilha Incahuasi, uma ilha coberta de corais (sim, aqueles do fundo do mar) e cactos de mais de 10m de altura no meio de uma infinidade de sal, a quase 4mil metros de altitude... inexplicável.

























Depois do passeio pelo salar, pegamos um ônibus para La Paz e dá-lhe conversar pra pôr os assuntos em dia! =)



Chegamos em La Paz de manhãzinha e só tomamos café e já pegamos outro ônibus para Copacabana (a boliviana, não a carioca!) para o pessoal conhecer o Lago Titicaca. O caminho é lindo, com vistas para montanhas nevadas e uma hora de viagem só pela borda do lago, vendo o quanto ele é grande e mais uma vez impressionante isso tudo a 4mil metros de altitude... como essa água toda não cai lá pra baixo?? No caminho também passamos por uma parte onde estava nevando, quando subimos um pouco. Isso me fez pensar que dali a alguns dias estaria passando por aquela região pedalando...na neve!







Lago Titicaca

Acabamos não ficando muito tempo em Copacabana por conta do tempo feio, nublado e frio. Conhecemos a igreja da Nuestra Señora de Copacabana (aquela avenida no Rio), fomos até a borda do lago e já voltamos para chegar a La Paz a tempo de conhecermos um pouco da cidade...

Curiosidade: a Copacabana do Rio, princesinha do mar, tem esse nome por causa da Nuestra Señora de Copacabana, a santa da Copacabana boliviana. De alguma forma que não me lembro agora uma imagem da santa foi parar no Rio e construíram uma igreja para ela onde hoje fica o forte de Copacabana, na época em que ali ainda era uma grande fazenda. A igreja acabou dando o nome ao bairro, mas não resistiu às ressacas e com o tempo o mar a destruiu. Mais tarde construíram o forte no lugar e nunca mais se falou sobre a igreja ou a santa...

Voltando a La Paz, demos uma volta pelo centro, conhecemos o a sede do governo do Evo Morales e um pouco dos mercados de rua.








Na manhã seguinte, mais uma despedida emocionante no aeroporto, com choradeira geral e desejos de boa viagem... Passei o dia ainda meio atordoado pelo turbilhão de emoções e a intensidade e rapidez daquele encontro.

No dia seguinte me mudei da pousadinha aonde tínhamos ficado para a casa da Liz, que conheci pelo Couchsurfing (santo couchsurfing!). um apartamento aconchegante com uma linda vista para uns paredões de pedra esculpidos pela natureza. Ali também estavam mais duas meninas que tinham chegado ali pelo couchsurfing, Elisa e Giselle. O filho da Liz me fez passar por um treinamento intensivo para ser tio quando voltar pro Rio. Amir era insaciável, dessas crianças cheias de energia que querem brincar o dia todo e que alegram qualquer casa. Adorei o tempo com ele, brincando de futebol, triciclo (cena hilária!), montar tapete de letrinhas, carregar no ombro, carregar pedras e água no trator dele no quintal do prédio... uma alegria só!



Enquanto as meninas falavam que depois daquela eu não ia querer ter filhos tão cedo, eu só pensava o quanto era lindo aquela pessoinha cheia de vontade de viver e pensava na Sofia, minha sobrinhazinha que tá láaa no Rio...

Em uma das noites na casa, eu e Elisa ajudamos Liz numa festa para solteiros e solteiras que ela estava promovendo, já que trabalha com uma agência matrimonial, que promove encontros para quem está buscando sua cara-metade... momento inesquecível e bem divertido (quem não tem curiosidade de ver quem vai a essas festas?).

Depois de alguns dias na casa de Liz, consegui contato com o Christian, um alemão que mora em La Paz há alguns anos e tem uma casa chamada “casa de ciclistas”, que está aqui só para o pessoal que está viajando de bicicleta e chega à cidade. Uma iniciativa louvável e que faz com que os cicloviajantes tenham um lar na Bolívia, além de um ponto de encontro pra bater um bom papo, discutir os caminhos dali pra frente, contar e ouvir histórias de viagem... lugarzinho abençoado!








A Casa de Ciclistas ficava ao lado de uma praça que merece uma menção aqui. Todos os dias à noite a praça se transformava em uma grande escola de dança, com vários grupos ensaiando sues passinhos, no melhor estilo lamberóbica (nunca escrevi essa palavra!). e os passos eram bem complicados. Lá também assisti Argentina e Brasil serem eliminados da Copa América em um telão enorme...










Enquanto estava em La Paz presenciei também o aniversário da cidade, que estava fazendo 202 anos. As comemorações duraram vários dias, com muitos desfiles militares e civis. E esses desfiles civis eram muito curiosos! Vários colégios, empresas e provavelmente todos os órgãos estatais desfilavam prestando sua homenagem à cidade, com direito a carros alegóricos e tudo... Uma coisa que me chamou a atenção nesses desfiles e nas exibições dos jogos da copa no telão foi a rapidez com que, após um evento, as pessoas desaparecem do lugar.

Acostumado com o Rio, onde depois de qualquer coisa de rua as pessoas ainda continuam no lugar por horas, ficava impressionado como dois minutos depois do fim dos desfiles já não havia viva alma no lugar e já estavam limpando a rua.









Enfim, passei uma semana entre a casa e o café de Christian e Luiza, sua namorada, enquanto preparava meu projeto para o Ulule, um site de crowdfunding (micro-financiamento), no qual qualquer pessoa pode ajudar a financiar um projeto que lhe agrade... em breve estará no ar, com a graaande ajuda de Aline Carvalho.cultura.tropicália.com (Brigadão tudoi!) e também preparando um email e duas matérias de “exemplo” pra mandar para revistas e sites de viagem, aventura, bicicleta, para tentar começar a escrever reportagens sobre minha viagem, vender fotos, etc...

Veremos no que dá, mas estou otimista. Aliás, conhece alguém que trabalhe em revistas dessa área ou algum veículo de comunicação que teria interesse pelo tema? Mande AGORA um email para leodcs@gmail.com!

Bem, é isso, depois de muito trabalho cibernético, agora estou caindo de novo na estrada em direção ao Lago Titicaca e a Cuzco, pra chegar à capital do império Inca a tempo da festa da Pachamama, Mãe Terra, no dia 1º de agosto.

Por esses dias tenho que agradecer um montão à Liz, minha anfitriã em Sopocachi e que me deu a oportunidade de conhecer Elisa, Giselle, Amir e Zenóbia, além da experiência da festa de solteiros... a Christian por oferecer o luxo dessa casa aconchegante e toda a ajuda que dá a todos os viajantes que chegam até ele... parabéns pela iniciativa! E à Aline por me incentivar a escrever o projeto para o Ulule e toda ajuda que me deu, a tradução para o francês... ê família! E também a todo mundo que me ajudou esses dias com as críticas ao texto que escrevi para as revistas...
Nessa viagem só estou sozinho na teoria, porque de fato tenho uma penca de gente viajando junto comigo, no meu coração, me ajudando das mais diversas formas possíveis e fazendo com que essa viagem seja possível. Muito Obrigado a cada um de vocês!