quinta-feira, 3 de março de 2011

Aldeia da Paz e Parabéns pra mim!

Continuando de onde parei... cheguei em Paranaguá pela manhã, fiquei na casa do Mauro e aproveitei a tarde pra dar uma geral na Caiçara. A coitada tinha areia em todos os lugares possíveis e impossíveis, e a relação estava coberta de ferrugem. Me apossei de uma mesa de concreto no quintal do prédio, arranjei uma mangueira e um pano velho e parti para a luta. Em Paranaguá não encontrei nenhuma loja boa de bike, que tivesse uma ferramenta (chave de cassete) que eu precisava pra trocar um raio que estava quebrado desde a estrada do despraiado, antes da ilha comprida, então aproveitei que o mauro estava subindo pra Curitiba e tbm fui no sábado cedinho, para terminar de dar a geral de aniversário de 1000km. Em Curitiba troquei o raio quebrado e mais alguns que estavam merecendo, o pneu da frente que já tinha saído do Rio bem gasto, e agora estava pedindo arrego, e ainda comprei uma fita de guidão para colocar por cima da espuma, que está com rasgos monstros nas laterais.

Em Curitiba me hospedei na casa do Narciso, outra boa alma da SBEE, e à tarde fomos ao jardim botânico, visitamos o Eliel, almocei um filet mignon com molho de mostarda delicioso, pegamos um toró daqueles que dei graças a deus de não estar de bike no dia, e à noite de quebra fomos ao churrasco de inauguração da casa nova de mais um amigo, Rodrigo Dias. Ele comprou um terreno e construiu a casa, e ficou bem legal.

Enfim, meu dia de Curitiba foi bem legal, e fui super bem recebido pela família do Narciso. No dia seguinte saí de manhã (depois de uma demorazinha por conta de um pneu murcho) e, depois de passar por uma feira e reabastecer meus estoques de frutas, castanhas e etc., fui em direção à estrada da Graciosa, uma estradinha que desce a Serra do Mar de Curitiba a Morretes, desde a época do império ( foi a segunda estrada a ser construída cortando a serra do mar, só perde para a de Petrópolis) e passa por uma região bem bonita, só de fazendas e mato, com muitas flores, pássaros...

No começo são uns 30 a 40 quilômetros de plano com algumas subidinhas, depois vem um descidão de 17km que é o ponto alto do trajeto. Nessa parte há um trecho em que a estrada é de paralelepípedo, cercada pela onipresente mata atlântica e muitas flores, riozinhos, algumas cachoeirinhas... é muito legal notar ao longo da descida a mudança na vegetação. Na parte alta, a estrada é cercada pelas tradicionais araucárias do Paraná, que aos poucos vão cedendo espaço para a exuberância da mata atlântica. No final da descida a mata já é bem alta e fechada.

Quando cheguei em Morretes, no final da estrada da Graciosa (final pra mim, porque ela continua até Antonina, na beira da baía de Paranaguá), dei uma volta pela cidade, vi o riozão cheio de gente curtindo um bóia-cross, esporte local, a estação do trem que vai até Curitiba, outro passeio lindo, e quase parei pra comer um barreado, o prato da região, que pelo que entendi é um ensopadão com várias carnes diferentes.

De lá fui seguindo até a BR 277, que vai de Curitiba pra Paranguá, e assim que cheguei na BR, fui pedalando junto com um outro ciclista e começamos a conversar. Samuel é um triatleta que está treinando para o IRONMAN (180km de bike, 42km de corrida e 4km de natação!!!) e que já completou o IRONMAN em 2008, em 13h50min. Fiquei impressionado! Fomos pedalando juntos até Paranaguá (eu suando pra acompanhar o ritmo dele, mesmo com pouco peso e ele com uma caloi ao invés da bike de triathlon) e paramos na casa dele pra tomar uns 2 litros de um suco de maracujá delicioso (o Paraná tem o maracujá mais gostoso que já provei) e tirarmos umas fotos do encontro do triatleta e do viajante, dois tipos diferentes de ciclistas.

No dia seguinte pela manhã peguei um barco para a famosa Ilha do Mel. Pra variar, acordei tarde, e naquele meu estado meio grog no qual acordo acabei não conseguindo fazer algumas coisas que queria (ir ao mercado, dar uma voltinha pelo centro histórico...) e ainda cheguei no cais no último segundo, com os caras já desamarrando o barco....

Chegando na ilha, encontrei um campingzinho barato, deixei a bike e fui conhecer a fortaleza e a praia da fortaleza. Bem bonito o lugar, e a fortaleza está super bem conservada, gostei mas penei no caminho com um solzão de rachar (meio-dia) numa caminhadinha de uns 4km sem sombra nenhuma. Depois que o sol baixou um pouco, fui para o farol, em uma outra ponta da ilha, para ver o pôr-do-sol. Chegando lá, o céu nublou e não teve pôr-do-sol nenhum.... paciência, de volta pro camping, jantarzão e cama.

No segundo dia na ilha, pretendia ir pra Encantadas, na outra ponta da ilha, logo de manhã, mas acordei preguiçoso, tomei café calmamente com o pessoal do camping, fui para a praizinha mais perto, a do farol, e fiquei por lá batendo um papo com um casal de sul-africanos. Quando a preguiça passou, fui encarar a caminhada. Valeu a pena! Passando pelas praias semi-desertas Grande e do Miguel, cheguei à própria praia de encantadas e à Gruta de mesmo nome. A gruta é bem legal, geólogos devem adorar, pq dá pra ver claramente como ela foi formada, pela erosão do mar em um veio no paredão rochoso que provavelmente é de um material mais frágil que o do entorno.

Na volta, debaixo de uma garoinha, passei no camping, peguei a caiçara e parti para o trapiche (cais) pra pegar o próximo barco para Pontal do Paraná. Não via a hora de chegar ao meu próximo destino, a Aldeia da Paz. Desci em pontal e fui pedalando pela avenida principal, sem saber ao certo onde era a aldeia, e procurando algum lugar com barracas, tendas, etc... depois de alguns quarteirões, vi umas barracas num terreno à minha direita. Ainda estava procurando alguma faixa ou outro indício de que fosse mesmo a Aldeia da Paz, quando alguém gritou lá de dentro: - Chegou, irmão! Pode entrar que você tá em casa! =)

Fui entrando, observando, as figuras que estavam no lugar e fui em direção a um toldo onde o pessoal estava fazendo um som. Já de cara conheci um casal de colombianos que está há 19 meses pedalando pela América do Sul, e pasmem: com seu casal de filhos, sendo que o mais novo nasceu na viagem! Vi que estava mesmo em casa. Aos poucos fui conversando com o pessoal que vinha ver quem tinha chegado com aquela bike carregada e vi que ali só tinha gente muito boa e cada um tinha uma história diferente pra contar. Cada um de um canto, chegando ali de um jeito... várias pessoas que viajam de bike, outros de carona, outros de carro...

Não tenho como descrever como foram meus dias ali, mas logo no segundo dia já tinha certeza de que ia ficar até o final, enão só dois ou três dias como tinha planejado. As pessoas ali eram muito interessantes, os papos rendiam muito, e aprendi muito com todos que viveram comigo nessa aldeia. Foi uma experiência muito especial morar por cinco dias em comunidade com essas pessoas maravilhosas. Ali a alimentação era a mais natural possível, com vários alimentos vivos, grãos germinados... banheiro seco, cozinha coletiva, trabalho coletivo... vivendo várias coisas que acredito e sobre as quais tenho matutado nessas estradas.

Colombianitos

Algumas figuras, sem desmerecer os demais, merecem uma menção especial. Thomas Brokaw e Leal Carvalho garantiam o alto astral com música de altíssima qualidade o tempo todo. Thomas ficou como um exemplo para mim, com sua calma e por viver absolutamente seus princípios...

Xaxá (é assim que se escreve) era uma figura a parte, puro alto astral... ainda vou visitá-la na Mantiqueira pra cavalgar pela serra....

Felipe e Vanda se desdobravam para resolver todo tipo de pendências e levar adiante a aldeia, Mandala compartilhava seus conhecimentos e liderava as espetaculares construções em bambu, com Lua, Fabio, os colombianos e o pessoal de Floripa aprendi vários bizus sobre viagens de bike, Renata era pura harmonia, Esmeralda me apresentou o Contato-improvisação (Alô Aline tudoi!), Ângelo os grãos germinados e a cozinha crua.....

Enfim, um graaaaaande abraço a todos que conviveram conosco nesses dias, e tenho certeza que nos ainda encontraremos muitas vezes por essa vida....

últimos da família a largar o osso...

Na segunda-feira, saí da Aldeia no início da tarde, depois de uma noite chuvosa e uma manhã preguiçosa e de arrumação da casa antes da partida... fui pedalando pela orla em direção a Matinhos, almocei num PF de 3 reais(!!!) (na verdade nem estava com fome, mas não podia perder essa oportunidade...), encontrei um companheiro da Aldeia, Soley, com seu jipão Niva Lobo Branco (lembrei da super máquina do magrão) na rua em Matinhos e de quebra ganhei um suco e pão de queijo batendo um bom papo na padaria dele, e peguei a estrada Alexandra-Matinhos em direção ao sítio onde mora um pessoal que estava na aldeia, a Tribo do Sol Nascente. No caminho, encontrei uma gatinha (aquele animal peludo, não uma mulher) na estrada, toda encolhida de medo e miando sem parar. Depois de algum tempo tentando viabilizar um jeito de carregá-la na bike sem ela pular pra fora, enquanto era devorado pelos mosquitos insaciáveis, acabei tendo que partir para a ignorância e coloquei ela dentro de uma camisa, com as mangas amarradas e a gola e a barra presas com elástico, dentro do capacete,
pendurado no guidão. Segui viagem por quase dez quilômetro com pena da pobrezinha e fazendo um carinho pra acalmar a coitada... quando cheguei ao sítio, o pessoal, que nem sabia que eu ia para lá, me recebeu super bem e adotaram a gata, que foi logo batizada de Lua Nascente (ela é toda preta e com um mancha branca na forma da lua nascente no peito).

O sítio é uma delícia, no meio do mato, sem barulho nenhum, só o som da floresta, sem luz elétrica, só com uma casinha estilosa para o povo dormir, e o pessoal tem vários cultivos em agrofloresta... Muito bom papo, chimarrão, banana colhida na hora...

Sol Nascente e Lua Crescente

No dia seguinte, já na trilhazinha que vai da casa no sítio até a estrada, parei pra tirar uma foto e quando vi a data, tomei um susto: 1º de março! Meu aniversário! Completando vinte e quatro anos de estrada na estrada. Não estava nem lembrando que já estava tão perto... Parabéns pra mim!

Fui pedalando pensando nesses 24 anos de vida e sobre tudo o que já vivi e as magníficas oportunidades que tive na vida, como a dessa viagem... fui até Caiobá, peguei a balsa para Guaratuba, atravessando a baía de Guaratuba e, a caminho de Itapoá, cruzei a divisa com Santa Catarina, sem placas para foto... Chegando em Itapoá, parei em um supermercado e comprei um chip da TIM (47 9902-3115), já que o meu chip da oi deu alguma ziquizira, e descobri que até a balsa que atravessa a Baía da Babitonga (adorei esse nome!) ainda faltavam 40 km, e boa parte de lama, e não uns 10km de asfalto como eu pensava... saí dali pensando que não ia dar pra chegar em Joinville, meu objetivo para o dia, e que ia ter que arranjar um lugar pra ficar...

Enquanto pensava isso, passa um carro por mim, dá uma buzinadinha, pára uns metros mais à frente, e um sujeito bota o cabeção pra fora e grita: - de onde vem esse maluco nessa bicicleta carregada???

Daniel estava na casa de um amigo em Itapema do Norte, uns 10km mais à frente, e me ofereceu um pouso e um banho, segundo ele pra retribuir os pousos que já ganhou em suas próprias viagens de bike...

Chegando lá conheci o Tonho, um amigo do Daniel e vizinho da casa aonde ele estava ficando. Os dois eram muito gente boa, cheios de histórias de viagens...

À noite o Daniel fez um peixe assado na brasa, com arroz, macarrão e uma saladinha. Jantarzão delicioso, com peixe fresquinho, direto da baía da Babitonga (ou do mar aberto, não faço idéia...) trazido pelo próprio pescador, Luciano...

Não poderia ter presente melhor de aniversário: um banho, um pouso, dois amigos e um jantar maravilhoso. E de manhã o Tonho ainda me arrumou uma carona até São Francisco do Sul, do outro lado da Baía, com Beto, um pescador que estava se preparando para sair para o mar aberto para lançar sua rede.

Em São Chico, como o pessoal chama por aqui, visitei o centrinho histórico, todo bonitinho, e fui para o museu do mar, enorme e espetacular, com o maior acervo de barcos do Brasil. O museu apresenta bem as embarcações tradicionais de pesca ao longo de todo o litoral brasileiro, com salas enormes para os principais estados nessa arte de fabricar barcos, além de falar da cultura, festas tradicionais e até da culiária de cada região. Só fiquei um pouco decepcionado porque o barco que o Amyr Klink usou em sua travessia do atlântico sul a remo, que fica exposto lá, não estava... está sendo restaurado....

Saí do museu esfomeado e decidi almoçar num restaurante arrumadinho como continuação das comemorações de aniversário, mas depois de olhar uns dois cardápios com precinhos espetaculosos (botei a culpa nos cruzeiros que atracam ali), me contentei com um Buffet livre de 15 reais pra encher a burra. Para fazer a digestão fui conhecer o museu histórico da cidade.

De lá, mais uma pedaladinha de duas horas até Joinville, onde liguei para o Paulo, meu contato na cidade, através do Fórum Estadual de Enconomia Solidária, e combinei de encontrá-lo no mercado municipal, onde fui parar seguindo as placas de centro. Enquanto esperava, papeando com dois caras que vieram perguntar sobre a bike e a viagem, ganhei 20 reais de ajuda para a viagem! Obrigado!!

Neste momento estou confortavelmente instalado na casa de uma amiga do Paulo, Sirlanda, tamvém da Economia Solidária e amanhã vou visitar algumas cooperativas e associações para o projeto....

Um grande beijo a todos e parabéns pra mim! 24 anos e pedalando...

10 comentários:

  1. arrepiada...ainda bem que chegaste em todos os teus destinos, pq todos os destinos sao teus!

    te ligo, meu amor, mas nao funfa!
    a saudade ja nem sei mais, meu primeiro ceu na terra sem bicicleta... como vai ser isso?

    joana te ama sempre. vou na sua casa pegar um liquidificador pra fazer receita de batida. pode? aiaiai.....coraçao....

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  2. Bici, feliz aniversário. Te amo!!! Muita luz e paz... vc está tendo a oportunidade da sua vida em chegar ao nirvana... vá!!! Um abraço...

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  3. bi, acho que esse foi um dos posts que mais me tocou até agora, talvez pela sincronia de acontecimentos bons, talvez por imaginar esses encontros espetaculares, talvez pela energia boa que vc transmitiu ao escrever ou talvez pelo meu momento de estrada interna.
    de qq forma, obrigada por ter compartilhado parte da evolução que estas vivendo!
    parabens pelos 24 anos! pensamos, falamos e sentimos falta de vc ontem!
    AMOR pra vc!
    abraço forte, naná

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  4. Fiquei uns bons minutos em silêncio, depois de ler/ver/sentir isso tudo que encontrei por aqui!
    muita felicidade em saber das tantas coisas boas que essas pedaladas estão te trazendo, amigo.
    bons ventor por aí, bicinho!
    um beijo e um abraço muito sinceros! feliz tudo novo!!!!
    JaÉrika

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  5. Sensacional o casal colombiano que teve um filho durante a viagem. Quanta coragem e vontade de viajar! Admiro pessoas assim.

    Parabéns pela sua viagem e pelo seu aniversário.

    http://alaska-ushuaia.blogspot.com

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  6. Parabéns, meu grande amigo! Aliás, parabéns duplo, pelo aniversário e pela beleza de viagem que está fazendo.
    O seu relato é tão presente que ao lê-lo parecemos estar interagindo com as pessoas, com os locais, com a mesma natureza que estás vivendo.

    Valeu camarada!

    Continue com Deus!!!

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  7. Muita informaçao! Muita coisa boa! Saulo

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  8. Cara muito legal seu blog!!! Parabéns!!! Adorei ler... Sucesso

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  9. Eeiii Léo, feliz aniversário atrasado, querido. Que viagem, hein??? Delícia!!! Siga seu rumo, meu amigo.
    Beijos

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